Caso 10 - Largando a chupeta

Eu disse neste blog, no Caso 8, que trata de minha experiência ainda quando criança, sobre a maneira como o costume de ler a Bíblia às noites se tornou um hábito por algum tempo em minha vida. 
Mas, afinal, o que é um hábito?
Seria algo que fazemos muitas vezes seguidas ao longo dos dias, dos anos, e que é bom para a nossa saúde, nossa cultura, nossa vida em geral? 
Pode ser.
E quanto àquilo que fazemos repetidamente, mas não nos parece ser benéfico?
É um vício?
Pode ser.
Dado que um vício é  nocivo por definição, questiono o porquê de sua existência. Se nos faz mal, porque não deixamos de fazê-lo? 
Essa é a razão de eu incluir nosso comportamento repetitivo como um dos muitos fenômenos estranhos e de me comprometer a tratá-lo aqui neste blog. Ainda que não pareça um fenômeno estranho, o comportamento repetitivo o é e posso dizer que ele não se limita ao ser humano, porque ele pode ser observado em outras espécies animais, o que o torna ainda mais estranho e curioso. Afinal, quem poderia imaginar que animais têm vícios? 
Geralmente associamos vícios a falhas morais, falhas de educação. Mas como atribuir falha moral a animais?
De minha parte, inicio minha abordagem, como tenho feito até agora neste blog, relatando minha experiência pessoal com o tema como uma forma de incentivo para que também outras pessoas compartilhem de suas experiências sobre fenômenos estranhos para fazer deste blog uma fonte de informação mais interessante para todos os seus leitores.
Classifico como sendo o Caso 10 o presente relato que faço agora como a minha mais antiga lembrança sobre um vício que admito que já tive, embora não tenha sido o único. Como já disse em outras postagens anteriores, sigo uma ordem cronológica em meus relatos. Busco registrar minha percepção ao longo do tempo sobre os acontecimentos que relato, e analisarei depois de que maneira essa percepção mudou ao  longo do tempo e porquê. 
Mas não agora.
Agora me aterei ao meu singelo e inocente vício de chupar chupeta.
Singelo, porque em geral não parece ser algo perigoso, arriscado ou nocivo a uma criança. E inocente, porque em geral somente as crianças chupam chupetas. 
Chupar chupeta era um vício porque o longo tempo chupando chupetas estava entortando meus dentes de leite. E as chupetas estavam entortando meus dentes exatamente porque eu não conseguia deixar de chupá-las. E chupar chupetas estava deixando de ser um comportamento inocente porque eu ainda as chupava quando comecei a frequentar a escola aos sete anos, uma idade na qual a grande maioria das crianças já não mais as chupava. Ora, um menino de sete anos chupando chupeta em plena sala de aula junto de todos os colegas era uma mostra de imaturidade, infantilidade ou, finalmente, apego desarrazoado às chupetas, ou, definitivamente dizendo, um vício desagradável e renitente.
Ainda assim, lembro-me de levar minha chupeta comigo para a escola, e ainda que não durante a aulas, eu a chupava nos intervalos dos primeiros dias de escola. 
Mas então a pressão dos coleguinhas fez-se pesar sobre meu brio de menino normal. Logo eles começaram a questionar o porquê de eu ainda não ter largado meu vício infantil, e eu simplesmente não tinha uma resposta, exceto a de que chupar chupeta era um costume gostoso. 
Foram questionamentos constrangedores mesmo para um menino de sete anos.
Certo, as chupetas eram macias e cheirosas e chupá-las durante as noites de sono era uma delícia, mas era um costume feio porque elas entortavam nossos dentes. Por que eu simplesmente não parava com o meu apego às chupetas? Todos diziam que era fácil. Muitos pararam de chupar bem novinhos. Não havia mais ninguém  que chupasse chupetas naquela idade. Ninguém mais chupava chupetas naquela escola.
Eu logo fui convencido de que não era uma boa ideia continuar chupando chupetas. Eu não queria ser diferente do resto dos alunos da escola e, pior, eu não queria ser visto como um menino fraco diante de um vício. E eu não queria se visto como um menino de sete anos que se comportava como um menino de três anos. Eu não queria ser visto como um tipo de retardado mental.
E numa manhã qualquer eu parei de chupar chupetas para sempre.
Não sofri nem um pouco com a falta delas. Logo me esqueci do caso. Nos anos seguintes meus dentes de leite caíram e os dentes novos e definitivos nasceram corretos e alinhados.
Eu vencera um vício bobo e fácil de ser vencido.
Então, por que as pessoas mais velhas, os adultos, também não largavam seus vícios bem mais perigosos e destrutivos, como o cigarro, as bebidas, as drogas ou qualquer outro que viessem a ter?
Não pensei no assunto por um bom tempo, porque um vício é um problema pessoal que cada qual que o tenha deve sabe lidar com ele da maneira que melhor lhe convier.
Só fui me apegar a um outro vício depois de virar um jovem adulto, mas esse novo vício será tema de um outro relato futuro, porque ele também é curioso e interessante.
Por hora, contento-me em saber que mesmo uma criança pode vencer um vício se houver condições adequadas para isso. No meu caso, houve a condição apenas para a manutenção do vício. Essa condição era a aceitação do vício por parte de meus pais, porque se eles houvessem tentado me dissuadir da chupeta antes de eu entrar para a escola eu a teria abandonado mais cedo. Meus dois irmãos já não chupavam chupeta enquanto eu continuava apegado a ela. Meus irmãos a abandonaram espontaneamente, mas meus pais poderiam ter contribuído para o fim do meu vício bem mais cedo. Por que não o fizeram? Não viam o ato como um vício ou um problema? Tinham dó de mim e do sofrimento que eu poderia vir a sentir diante da abstinência da chupeta? 
Não sei.
No fim, eu tive que lidar com o problema por meio dos meus próprios recursos internos e resolvi o problema de maneira satisfatória.
Mas nem todos os vícios são assim tão fáceis de serem resolvidos.
Nosso cérebro é o centro de quase todos os nossos vícios. E, a despeito de toda a pesquisa que o envolve, resta ainda muito a se saber sobre seu funcionamento. Um vício que deixasse de ser um vício seria uma conquista em termos diversos. O fumo, por exemplo, ou as drogas deixariam de ter o apelo que têm para os seus usuários se soubéssemos como controlar o mecanismo mental que as torna tão atraentes. 
De qualquer forma, um vício é um indício doloroso de que não somos capazes de controlar a nós mesmos. É um mistério o fato de que tenhamos a falsa sensação de controle sobre nós mesmos. 
Assim, um vício é um fenômeno estranho que me interessa, e que embora seja alvo de muitos estudos, ainda não foi satisfatoriamente esclarecido.
Tentaremos entendê-lo melhor nesse blog.
E quanto a você?
Você controla sua vontade à vontade? Nunca teve vícios?
Conte-nos sobre o que pensa sobre o tema.
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