Caso 52 - Tu vens

 Caso 52 - Tu vens


A mente humana pode ser manipulada por outra mente humana?

De certa forma sim, mas é assustadora a ideia de que podemos ser manipulados por outras pessoas. Claro que podemos ser manipulados quando crianças, mas e quando já adultos?

Saber que somos manipuláveis depois de adultos nos deixa vulneráveis.

Mas mais perturbador que isso é saber que podemos ser manipulados sem que saibamos sequer quem são nossos manipuladores. Essa possibilidade é as vezes alardeada pela mídia e pela literatura de tempos em tempos. As empresas capitalistas estão usando técnicas de persuasão psicológica em seus comerciais, afirmam os críticos bem intencionados. O cinema está cheio de imagens que nos induzem a consumir produtos e a adquirir hábitos que não precisamos nem desejamos, alertam as associações de proteção de jovens e crianças. As letras das músicas estão cheias de referências a coisas que não aprovamos, embora as cantemos sem perceber, alertam as igrejas.

O presente caso trata exatamente dessa última situação.

Ele deu-se por volta de 1984.

No vilarejo em que vivíamos não havia teatros. Havia apenas uma escola, um clube e uma igreja católica frequentada pela maioria da população. Havia ainda uma igrejinha evangélica menor, bem menos frequentada.

Assim, qualquer evento que envolvesse a apresentação de informações, fosse um show de teatro, ou uma palestra, ou um evento musical, era realizado ou no salão do clube ou no pequeno espaço para eventos no saguão da escola. Esses eventos não eram muito comuns, mas ainda assim ocorriam de vez em quando.

Foi uma palestra apresentada à noite, creio que em um fim de semana, quando não havia aulas noturnas. Naquela época não havia tantas restrições éticas no uso de espaços públicos para eventos de cunho religioso. Assim, alguém, um pastor, ou algum teólogo, ou psicólogo talvez, de alguma igreja fora do vilarejo, veio palestrar sobre os riscos da manipulação mental.

Era um senhor de meia idade, de terno, o que era incomum no local. As pessoas se assentaram nas cadeiras emprestadas das salas de aula e atentamente acompanharam as explicações desse senhor, cujo nome não me recordo.

Ele falou sobre as misteriosas mensagens subliminares. Explicou que elas eram inseridas nos comerciais, mas seu foco não era no uso comercial das mensagens, mas no seu uso religioso. Para ele, o perigo real delas estava em nos incutir palavras e frases sem que percebêssemos, palavras e frases que iam contra o pensamento cristão de um modo geral, mas que tinham um perigo ainda maior em potencial.

Que perigo era esse?

Ele citou a adoração ao diabo como um dos perigos que os cristãos corriam sem saber ao serem influenciados pelas mensagens subliminares em músicas.

Como isso se dava?

Ele explicou que havia duas maneiras de se inserir mensagens subliminares em músicas: diretamente nas letras das músicas, ou indiretamente, inserindo-as de forma a que só eram perceptíveis quando a música era tocada ao contrário.

Citou bandas cujos autores das letras tinham inserido palavras e frases claramente voltadas à adoração do diabo, fossem em passagens diretas ou escondidas e descobertas somente após rodar os discos da época ao contrário. Ele tinha um gravador acoplado a uma caixa de som junto ao palco e esses trechos de música eram então reproduzidos nos pontos onde podíamos ouvir, de forma grotesca e assustadora, a mensagem de adoração ao diabo quando determinado trecho era tocado ao contrário.

Por fim, abordou algumas músicas em português, músicas nacionais, cujas letras abertamente falavam na adoração ao diabo, mas de uma forma cifrada que somente após alguma explicação passaríamos a entender o real significado da letra, embora que sem essa explicação podíamos até ter nossa própria interpretação, incorreta, era óbvio, daquilo que ouvíamos, geralmente tido como meras passagens poéticas ou arranjos de temas de forma apenas a dar alguma coerência às rimas musicais sem maiores significados implícitos.

As músicas de bandas e artistas internacionais também foram citadas, mas como ninguém sabia inglês na época, as passagens não faziam muito sentido. Já as músicas nacionais, em português, eram mais assustadoras.

Por fim, ele pegou a letra de uma música de Alceu Valença, chamada Anunciação, uma música lançada em 1983 em um disco chamado Anjo Avesso. Não é preciso dizer que o mero nome do álbum já fosse motivo para alarme do ponto de vista religioso, mas isso não foi dito à época.  O que foi dito era que a música era claramente um aviso da chegada de alguém poderoso e, a se levar ao pé da letra o nome do álbum, mau.

Veja a letra, resumidamente:

Na bruma leve das paixões que vêm de dentro

Tu vens chegando pra brincar no meu quintal

No teu cavalo peito nu, cabelo ao vento

E o sol quarando nossas roupas no varal

Tu vens, tu vens

Eu já escuto os teus sinais

Tu vens, tu vens

Eu já escuto os teus sinais

A voz do anjo sussurrou no meu ouvido

Eu não duvido, já escuto os teus sinais

Que tu virias numa manhã de domingo

Eu te anuncio nos sinos das catedrais

Mas será isso mesmo?

Segundo o nosso palestrante, sim. Cada palavra nessa letra não é poesia, mas invocação.

Ele deu uma explicação religiosa sobre o significado de quintal, cavalo, brincar,  domingo, catedrais, dentre outras palavras que não me recordo agora, mas que tinham uso especial dentro de certos círculos que diferiam do significado comum que damos à elas. E ao final de sua palestra, estávamos todos muito assustados, imaginando que estávamos adorando o diabo sem saber por simplesmente estarmos cantando Anunciação.

a palestra acabou e fomos embora para casa, agora um pouco mais espertos e desconfiados a respeito das mensagens subliminares.

Mas elas existem de verdade? E se existem, funcionam?

E se funcionam, podem nos fazer adorar algo que abominamos?

Essas respostas eu não as tenho agora, e nem as terei nos próximos textos que postarei aqui, porque para mim ainda é um tema em aberto. No entanto, o desafio intelectual está lançado, e para você também, leitor, para que juntos tenhamos mais casos de mensagens subliminares e mais possíveis respostas ou teorias que possam dar pistas de respostas que ainda não temos, ou que eu pessoalmente ainda não tenho. Portanto, conto com sua colaboração.

Conte-nos sobre o que sabe sobre o tema e cite mais músicas suspeitas. Conte o que pensa sobre o assunto e indique livros e filmes que abordam essas estranhas construções.

Ficaremos gratos em conhecê-las.


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