Caso 3 - A morte

A morte pode ser considerada um fenômeno estranho?
Eu entendo que sim.
A morte é um fenômeno curioso e o seu status de fenômeno absoluto, do qual ninguém pode se furtar, mas que a crer em relatos históricos não é tão absoluto assim, merece toda a nossa consideração.
A despeito da questão filosófica e psicológica que a envolve, há em torno dela todo um universo de mistérios, excentricidades, anomalias e casos dignos de serem narrados, estudados e, quem sabe, passíveis de respostas razoáveis.
De minha parte, conheço o fenômeno da morte desde muito cedo.
Mas antes preciso detalhar  a que tipo de morte me refiro, porque a morte é um fenômeno quase universal. O bife que você come é a morte de um animal. A folha de alface que você mastiga é a morte de um vegetal. Um cão que morre de velho é também um fenômeno digno de atenção. E quanto à morte de um ser humano, então o fenômeno ganha dimensão gigantesca. E é sobre esta, a morte humana, que me refiro agora e o faço somente como um incentivo para que você, leitor, possa pensar no assunto e, quem sabe, incluir neste blog alguma experiência que considere digna de ser relatada e analisada.
Conheci a morte de um ser humano bem cedo.
Eu tinha três anos quando meu avô paterno morreu em uma noite escura dentro de nossa casa, asfixiado por um enfisema pulmonar.
Lembro-me da estranheza do clima tenso e desesperado após acordar com o barulho de meus pais tentando controlar a situação. A escuridão. O meu avô estertorando no quarto, meu pai junto dele e nós, crianças, mantidos na sala por minha mãe, que tentava nos acalmar ao mesmo tempo em que procurava ajuda com uma tia na casa ao lado, em busca de um médico inexistente, de um farmacêutico milagroso que estaria dormindo a vários quarteirões dali, na sua casa com uma farmácia em frente, incapaz de qualquer ação real. O meu pai saindo do quarto derrotado. Os choros, os parentes se juntando na casa pequena. E depois, no dia seguinte, como que se eu tivesse dormido em um sofá qualquer e acordado com tudo já pronto, o meu avô na sala em um caixão, os candelabros com velas, o cheiro pungente de flores e os parentes falando baixo.
Depois, colocaram o caixão em um carro e um pequeno cortejo sumiu na esquina próxima. Meu avô se foi para sempre. Nós, crianças, ficamos em casa. Não tínhamos um carro. Éramos um estorvo naquele momento. Não fomos ao cemitério. Minha última imagem de meu avô foi no caixão na sala.
A casa ficou um tanto quanto mais vazia e triste depois daquele dia. Passamos, nós, as crianças, os três irmãos, a dormir na cama de casal deixada pelo meu avô. Não sei onde dormíamos antes de vagar essa cama. Mas ela nos acolheu, aos três, que passamos a dormir de atravessado na cama para que todos coubessem nela, mas de alguma forma mais confortáveis a partir de então.
E depois de meu avô, outras pessoas foram morrendo naquele vilarejo pacato. Uma senhora ali, com algodão no nariz estendida no caixão, um velhinho na esquina, um senhor cujo coração parou pela obesidade e outra senhora mais ao longe, bastante idosa e cansada de viver. Um acidente automobilístico de proporções dolorosas ceifou mais algumas vidas alguns anos depois e um tiro perfurou uma camisa vermelha de um tio bem na altura de seu coração.
Eu não fui e você, leitor, certamente também não foi poupado dessa experiência triste e dolorosa.
Mas não é somente sobre a morte natural ou acidental que nos debruçaremos aqui. A morte é um evento muito mais misterioso do que podemos supor no momento presente.
Qual foi sua primeira experiência com a morte?


Comentários

Postagens mais visitadas