Caso 2 - Pessoas estranhas

Meu segundo caso pessoal é aparentemente bem pouco impressionante e digno de crédito à primeira vista, mas somente à primeira vista.
Eu deveria ter quatro anos de idade e tinha dois irmãos, um mais velho, com uns seis anos, e outro mais novo, com não mais do que dois anos. Éramos quase bebês e eu nunca tinha saído de casa para brincar na rua. Naquela época, por volta de 1974, vivíamos em um vilarejo seguro e tranquilo, mas ainda assim, dado que era uma época de simplicidade e pobreza, eu nunca tinha ido brincar em lugar nenhum além da minha própria casa. Não conhecia o mar, os parques ou os brinquedos eletrônicos que só viriam a ser populares alguns anos depois. Então brincar era mais um ato entre irmãos, destituído de tecnologia. E era um ato caseiro, no quintal, debaixo dos móveis, mas até então nunca fora de casa.
Até o dia em que minha mãe nos deixou ir até a esquina da rua de casa para brincarmos sob uma grande árvore. Havia apenas mais duas casas até lá, e o terreno da esquina era ocupado pela casa de uma tia. Para nós, crianças, era um outro mundo, fascinante. A árvore era uma imensa mangueira, com seus galhos pesados e flexíveis escorrendo do tronco rumo ao chão, onde poderíamos nos dependurar e brincar à vontade, como fazem todas as crianças.
Essa primeira saída para a rua só foi possível porque era muito perto de casa, era uma tarde tranquila de calor e não havia risco algum. Além disso, meu irmão mais velho tinha já seis anos e poderia pedir ajuda à minha tia caso algo acontecesse.
Mas nada aconteceu. Fomos para debaixo da mangueira, brincamos e voltamos para casa todos sãos e salvos. Foi a primeira das muitas e muitas vezes em que saí de casa para brincar e a vida seguiu sem maiores sobressaltos.
Então por que essa primeira saída foi tão importante?
Ela foi importante porque no momento exato em que saíamos minha mãe olhou fundo em nossos olhos e disse muito enfática e seriamente que poderíamos ir brincar, mas que tomássemos muito cuidado com estranhos. Ela simplesmente estabeleceu a seguinte regra para aquele passeio: não deixar nenhum adulto, ou alguma criança mais velha, ninguém, absolutamente ninguém tocar os nossos corpos, em local algum, sob nenhum pretexto e caso isso viesse a ocorrer, ao menos em tentativa, deveríamos gritar e correr e pedir socorro à minha tia logo ali na casa ao lado a poucos metros da mangueira.
Aquele alerta marcou a minha vida.
O que minha mãe queria de fato dizer com aquele alerta rigoroso?
Todas as mães aparentemente dão em algum momento em nossas vidas aquele aviso tão conhecido de todos: não converse com estranhos.
A aparente banalidade desse aviso trás em si algo que considero hoje um fato bem estabelecido: o mundo é um lugar perigoso e sinistro e está de fato, tal como sugeriu minha mãe naquele dia, cheio de pessoas estranhas, muitas delas terrivelmente perigosas e ameaçadoras.
Nossas mães não estavam exagerando. O mundo está abarrotado de pessoas más e perigosas que são definitivamente uma grande ameaça a todas as pequenas crianças inocentes em todo o mundo, quando não são uma ameaça mesmo para os adultos.
Você duvida?
Você discorda da existência dessa ameaça? Você acredita que o mundo é um local seguro e as pessoas estranhas não são de fato estranhas, são apenas pessoas desconhecidas, mas cheias de bondade e inocência, e estão aí junto das crianças pequenas para ajudar e não para colocá-las em risco? Discorra aqui neste blog sobre o que pensa do assunto. Sinta-se à vontade para detalhar seu ponto de vista.
Antes daquele dia, o dia do aviso sobre as pessoas estranhas, eu vivia em um nível de cognição típico de uma criança no qual tomava por boas todas as pessoas do mundo, inclusive os adultos. Nunca sofrera nada de mau em decorrência da ação de nenhum adulto estranho e tendo meus pais como referência e exemplo de adultos, supunha que esses só poderiam ser pessoas bondosas, sempre dispostas a proteger e ensinar as crianças pequenas. Afinal, o que eles poderiam fazer de mau a uma criança e, mais importante, por que eles haveriam de querer fazer alguma maldade a uma criança?
Mas o alerta fixou-se definitivamente.
Hoje, o conceito que tenho das pessoas estranhas vai além da ideia de que elas podem fazer alguma maldade e ser um risco para crianças pequenas brincando nas esquinas longe das suas mães e sem a presença de adultos para protegê-las.
Hoje, tenho um conceito que é amplo o bastante para tratar qualquer tipo de ameaça entre humanos como um caso de predador e presa.
Mas isso é assunto para outro momento.
Faça sua contribuição, se quiser. Relate se você foi um dia alertado sobre as pessoas estranhas. Fale sobre suas experiências com elas.
O que aconteceu? Você confia em pessoas estranhas?
Falaremos mais sobre elas em postagens futuras.

Comentários

Postagens mais visitadas